Rotinas de pensamento e seu potencial para uma aprendizagem mais profunda

Na busca por estratégias eficazes, muitas vezes nos deparamos com o desafio de como engajar os estudantes em uma aprendizagem significativa e profunda. É aqui que as rotinas de pensamento entram em cena, oferecendo ferramentas e estruturas para promover uma compreensão mais profunda e uma reflexão crítica em sala de aula.

In the traditional transmission model of teaching, the roles for students and teachers are well defined. The teacher delivers, often through lectures, PowerPoint slides, or assigned readings, and the student is the receiver, taking in the delivered information. If classes are interactive, they often consist of little more than teachers questioning students to see if they know the material. In this model, “good” students are well prepared, so as not to be caught out by the teacher’s questions, whereas so-called “poor” students merely disengage or participate only when required. Unfortunately, this parody is a well-documented reality for far too many students.

No modelo tradicional de transmissão do ensino, os papéis dos alunos e professores são bem definidos. O professor entrega, muitas vezes por meio de palestras, slides do PowerPoint ou leituras atribuídas, e o aluno é o receptor, absorvendo as informações entregues. Se as aulas são interativas, muitas vezes consistem em pouco mais do que os professores questionando os alunos para ver se eles conhecem o material. Neste modelo, os “bons” alunos estão bem preparados, para não serem pegos de surpresa pelas perguntas do professor, enquanto os chamados “maus” alunos simplesmente se desengajam ou participam apenas quando necessário. Infelizmente, essa paródia é uma realidade bem documentada para muitos alunos.

(Lyons 2004; Pianta et al. 2007; Ritchhart 2015; Mehta and Fine 2019).

As rotinas de pensamento são estruturas simples, projetadas para guiar os estudantes através de processos cognitivos complexos, possibilitando que, diferente do que observamos na citação acima, as aulas tenham como propósito desenvolver o pensamento dos estudantes e, por meio dele, possibilitar aprendizagem significativa e profunda.

As rotinas de pensamento fornecem um conjunto de passos claros e que se repetem estruturalmente com o propósito dos estudantes explorarem ideias, estabelecerem conexões, formularem perguntas e construírem compreensão em torno de diversos conceitos e temas.

Uma das principais vantagens das rotinas de pensamento é que elas ajudam os estudantes a tornar seu pensamento visível. Ao seguir uma rotina, os alunos são incentivados a expressar suas ideias, argumentar seus pontos de vista e justificar suas respostas. Isso não apenas possibilita que os professores avaliem o entendimento dos alunos, mas também promove a metacognição, ou seja, a capacidade dos alunos de refletir sobre seu próprio processo de pensamento.

Além disso, as rotinas de pensamento são flexíveis e podem ser adaptadas para se adequarem a um amplo conjunto de áreas, componentes currículares e segmentos. Desde a sala de aula de matemática até a aula de ciências ou de literatura, as rotinas de pensamento podem ser utilizadas em qualquer contexto educacional para promover uma aprendizagem mais profunda e significativa.

Outro benefício das rotinas de pensamento é que elas promovem uma cultura de colaboração e engajamento em sala de aula. Ao seguir uma rotina em grupo, os alunos são incentivados a compartilhar ideias, ouvir os pontos de vista dos colegas e construir conhecimento coletivamente. Isso cria um ambiente de aprendizagem colaborativo, onde todos os alunos se sentem valorizados e respeitados como pares na construção do conhecimento.

Em resumo, as rotinas de pensamento têm o potencial de transformar a maneira como os alunos aprendem, promovendo uma compreensão mais profunda, reflexão crítica e colaboração em sala de aula. Ao integrar rotinas de pensamento em nossa prática pedagógica, podemos capacitar os alunos a se tornarem pensadores independentes e aprendizes ao longo da vida.

Como fiz em outra postagem sobre esse tema, seguem algumas sugestões de rotinas para serem utilizadas em sala de aula:

Rotina de pensamento: Dê um, receba um
Rotina de pensamento: Os 3 porquês

Para saber mais, seguem materiais de referência (em inglês):

RITCHHART, Ron. Cultures of Thinking in Action: 10 Mindsets to Transform our Teaching and Students’ Learning. John Wiley & Sons, 2023.

RITCHHART, Ron; CHURCH, Mark. The power of making thinking visible: Practices to engage and empower all learners. John Wiley & Sons, 2020.

Por que discutir a Educação Híbrida?

A educação híbrida, uma abordagem que integra os ambientes de aprendizagem presenciais e online, tem como propósito promover uma transformação da gestão das aulas, conectando as experiências de aprendizagem com as necessidades e as expectativas dos estudantes da educação básica ao ensino superior, conectando-se não só às necessidades individuais dos alunos, mas às novas demandas de uma sociedade cada vez mais digitalizada.

Mas, o que é Educação Híbrida? Já falamos sobre essa definição neste texto. No Ensino Híbrido,o digital é essencial. Na Educação Híbrida, as possibilidades são variadas e as diferentes combinações de experiências de aprendizagem cumprem a função de promover uma aprendizagem que conecta o estudante com os objetos de conhecimento. Essa combinação permite que o processo educativo se estenda além das paredes da escola, proporcionando uma continuidade da aprendizagem em diferentes contextos e horários. Então, qual é o ponto central de uma educação híbrida?

Para uma reflexão sobre uma educação híbrida, identificamos alguns pontos essenciais.

  1. O primeiro se refere aos aspectos fundamentais para que a educação híbrida atinja todo o seu potencial, colocando o estudante e as relações que ele estabelece com o conhecimento no centro do processo.
  2. O segundo ponto está relacionado aos modelos de implementação que podem ser organizados em diferentes cenários.
  3. O terceiro ponto diz respeito à formação dos educadores para que a educação híbrida possa ser organizada de forma equilibrada, coerente e abrangente.

Potencial da Educação Híbrida O verdadeiro potencial da educação híbrida reside na sua capacidade de personalizar a aprendizagem. Cada aluno tem a oportunidade de aprender no seu próprio ritmo, revisitar conteúdos conforme necessário e explorar novos recursos digitais que tornam o aprendizado mais dinâmico e interativo. Além disso, esse modelo promove o desenvolvimento de habilidades importantes como pensamento crítico, argumentação, colaboração, criatividade, entre outras.

Desafios e Oportunidades Embora a educação híbrida ofereça muitas vantagens, ela também apresenta desafios significativos, especialmente no que diz respeito à capacitação de professores, desenvolvendo competências digitais que favoreçam uma aula inovadora e possivelmente mediada por recursos digitais, e à infraestrutura tecnológica necessária. No entanto, esses desafios também representam oportunidades para desenvolver soluções inovadoras que podem ser escaladas para melhorar o sistema educacional como um todo.

Assim, a educação híbrida não é apenas uma resposta temporária ou uma tendência passageira; ela também não solucionará todos os problemas da educação. Ao considerar as tecnologias digitais entre muitas outras oportunidades de ampliar o espaço da sala de aula para uma aprendizagem contextualizada, podemos oferecer uma educação mais acessível e personalizada que considera os estudantes que anseiam por mais oportunidades de protagonismo e agência em sala de aula.

Convite: Se você chegou até aqui, talvez seja um interessado no tema, ou talvez já realize ações como essa em sala de aula, mediadas ou não por tecnologias digitais. Se tiver interesse em compartilhar comigo o que tem realizado, para que eu divulgue suas experiências (em abril, estarei na Bett e vou adorar levar seu relato!!), ou se já realizou alguma formação com a minha mediação e quer contar o que está fazendo, clica no botão e vamos conversar?

Quer saber mais? Acompanhe o Podcast com uma entrevista feita comigo sobre o tema e envie suas dúvidas, suas reflexões sobre como podemos ampliar essa conversa!

Comprometimento com a aprendizagem: algumas reflexões

Refletir sobre as melhores estratégias para possibilitar a aprendizagem dos estudantes tem sido sempre um desafio para educadores. Usualmente, nos deparamos com novas estratégias, principalmente aquelas vinculadas com as metodologias ativas, mas sempre há a dúvida sobre o quanto elas são realmente eficazes para identificarmos melhores resultados não apenas em engajamento, mas em aprendizagem.

Deparei-me com algumas publicações que trazem aspectos interessantes para essa reflexão e compartilho alguns insights por aqui. Neste texto, vou me debruçar sobre um ponto fundamental para o processo que é o comprometimento com a aprendizagem.

Nem sempre é fácil garantir que os estudantes, em todos os segmentos, comprometam-se com o percurso que o educador desenhou para o trabalho com um determinado tema, o desenvolvimento de uma habilidade, etc. Vários estudos, porém, mostram que ter clareza do que deve ser alcançado e ser monitorado nesse processo favorece o comprometimento e, assim, os resultados da aprendizagem são mais visíveis. Para isso, são pontos de atenção:

  1. Ter objetivos concretos e exequíveis é mais eficaz do que desenhar metas ambiciosas, que demoram muito a serem atingidas (Page-Voth & Graham, 1999). Ter objetivos para uma aula, ou uma sequência de até 3 aulas, portanto, pode ser mais eficaz e recompensador para o estudante do que aguardar a avaliação bimestral, por exemplo.
  2. Objetivos específicos são melhores do que objetivos vagos (Midgette et al. , 2008; Schunk & Swartz, 1993). Isso significa que, ao analisarmos a taxonomia de Bloom, por exemplo, vemos que apresentar como um objetivo um verbo que representa uma categoria (por exemplo, compreender a importância da luz para a fotossíntese) torna difuso o que se espera ao final de uma sequência de aulas do que utilizar um verbo que gere evidências mais específicas (por exemplo, descrever o processo de fotossíntese identificando o papel da luz para a produção de alimento).
  3. Metas são mais eficazes quando associadas com feedbacks específicos e “construtivos”. Ou seja, quando estabelecemos as metas e proporcionamos momentos de troca entre pares e/ou com a professora ou o professor, o estudante tem mais parâmetros de onde precisa melhorar e é apoiado a refletir sobre como fazê-lo, o que torna o processo mais efetivo (Fuchs et al., 1999, Glaser & Brunstein, 2007; Limpo & Alves, 2014), o que estimula a mentalidade de crescimento, uma vez que os estudantes percebem que os bons resultados são frutos de seu comprometimento com as propostas.

Há muitas outras reflexões que podemos extrair de publicações que têm como foco a escolha de melhores caminhos para que as estratégias em sala de aula que promovam aprendizagem, mas, certamente, nossa experiência em sala de aula pode trazer ainda mais insights para essa discussão. O que acha?

Referências:

Fuchs, D., Fuchs, L. S., Mathes, P. G., & Simmons, D. C. (1997). Peer-assisted learning strategies: Making classrooms more responsive to diversity. American Educational Research Journal, 34(1), 174–206. https://doi.org/10.2307/1163346

Glaser, C., & Brunstein, J. C. (2007). Improving fourth-grade students’ composition skills: Effects of strategy instruction and self-regulation procedures. Journal of Educational Psychology, 99(2), 297–310. https://doi.org/10.1037/0022-0663.99.2.297

Limpo, T., & Alves, R. A. (2014). Implicit theories of writing and their impact on students’ response to a SRSD intervention. British Journal of Educational Psychology, 84(4), 571–590. https://doi.org/10.1111/bjep.12042

Midgette, E., Haria, P. & MacArthur, C. The effects of content and audience awareness goals for revision on the persuasive essays of fifth- and eighth-grade students. Read Writ 21, 131–151 (2008). https://doi.org/10.1007/s11145-007-9067-9

Page-Voth, V., & Graham, S. (1999). Effects of goal setting and strategy use on the writing performance and self-efficacy of students with writing and learning problems. Journal of Educational Psychology, 91(2), 230–240. https://doi.org/10.1037/0022-0663.91.2.230

Schunk, D. H., & Swartz, C. W. (1993). Goals and progress feedback: Effects on self-efficacy and writing achievement. Contemporary Educational Psychology, 18(3), 337–354. https://doi.org/10.1006/ceps.1993.1024

Metodologias ativas: autores de referência 2

Nessa série de postagens, a ideia é relacionar elementos das metodologias ativas embasados nos pressupostos teóricos de autores de referência, distanciar dos modismos e apoiar solidamente princípios que não são novidades na educação, mas que já vêm sendo discutidos por muitos pesquisadores e que nos auxiliam na tomada de decisões. Vamos lá, então!

John Dewey (1859-1952)

Há muito temos defendido, nas discussões sobre metodologias ativas, sobre a construção de “experiências de aprendizagem”. É impossível falar dessa temática sem fazer referência à John Dewey ( 1859 – 1952), um dos filósofos americanos mais importantes do século XX, expoente da Escola Nova e que tem em seus textos uma importante reflexão sobre educação democrática e seu potencial na construção de uma sociedade. Muitos termos fundamentais utilizados até hoje, principalmente ao seu considerar a inovação na educação, remetem aos estudos e pesquisas de Dewey. Vamos dar início, nesse texto, com o termo “propósito”, como apresentado no texto anterior.

Um propósito é um fim em vista, isto é, envolve previsão das consequências que resultam de ação por impulso. Previsão das consequências envolve a operação da inteligência. (…) A formação de propósitos é, portanto, operação intelectual mais complexa do que poderia parecer.

DEWEY, 1938

O autor alerta, portanto, que o papel do professor é apoiar na construção de propósitos (poderíamos até pensar em uma relação com os inéditos viáveis de Freire) a partir de necessidades geradas por impulsos, mas que só se transformariam em ação a partir da “observação inteligente, de busca de informações e de julgamento lúcido”. Nesse sentido, o autor alerta para algo que muito defendemos em experiências de aprendizagem com foco em metodologias ativas que é o papel do professor na condução, no planejamento das ações a serem desenvolvidas pelos estudantes. Protagonismo do estudante, estudante no centro do processo, desenvolvimento da autonomia não significa que cada um fará o que quer, quando quer e como quer sem que tenha o apoio de um par mais experiente que, na educação escolar, é o professor. Também não significa que o passo a passo desenhado pelo educador será de tal forma engessado que todos os estudantes caminharão no mesmo tempo, ritmo e percurso. O equilíbrio entre a condução das experiências de aprendizagem de forma colaborativa, contextualizada e alinhada com as necessidades da ação que se pretende promover e que estejam conectadas ao propósito é fundamental para o desenvolvimento de competências e habilidades.

Assim, o autor reforça a importância da “continuidade da experiência”, diferenciando a experiência “de valor educativo” da experiência “sem valor”. A experiência de valor educativo se conecta com experiências anteriores e se articula com experiências futuras, tornando a aprendizagem um entrelaçamento em que o “passado” é meio para compreender o “presente” e desenhar o “futuro” no estabelecimento de propósitos.

A experiência sem valor, por sua vez, é aquela interessante, divertida, mas que não promove a aprendizagem. Nesse sentido, há contraposição entre experiências pontuais, como o uso de um recurso digital (um jogo, uma nuvem de palavras, uma enquete) descontextualizado daquilo que se pretende desenvolver e o efetivo uso de um recurso que promove a ação, a reflexão e a construção de conceitos (que é o que se defende nas metodologias ativas). Infelizmente, com as experiências “sem valor” perde-se a oportunidade educativa, defende-se que houve uso de metodologias ativas (sendo que se tratou de uma prática isolada) e toda uma reflexão sobre uma educação que promove o desenvolvimento do estudante pode ser desacreditada…

O interessante de estabelecer relação entre as reflexões desses autores (entrelaçar o passado) com o que observamos hoje na educação (entender o presente) nos ajuda a pensar os melhores caminhos (desenhar o futuro) para evitar equívocos e o desmerecimento de propostas que muito se conectam com os estudantes de hoje e que poderiam ser melhor exploradas (experienciadas!) no dia a dia das escolas.

Metodologias ativas: autores de referência 1

Os estudos sobre metodologias ativas remetem às bases teóricas de muitos autores. Nesse sentido, quanto mais estudamos sobre a construção de experiências de aprendizagem com foco no desenvolvimento dos estudantes, mais nos deparamos com pressupostos teóricos fundamentados em autores como Dewey, Piaget, Vigotski, Paulo Freire. Hoje, neste primeiro texto, começarei com Paulo Freire, nascido em 1921, completou seu centenário no ano passado e é o Patrono da Educação Brasileira.

Várias são suas contribuições para a educação, em particular, às metodologias ativas. Vamos analisar algumas citações a partir da lente das metodologias ativas:

Tenho defendido, assim como é possível encontrar no texto de José Valente no nosso livro Metodologias Ativas para uma educação inovadora, que o processo de aprendizagem, de construção de conceitos, tem um percurso baseado na autonomia, apoiado, obviamente, pelo par mais experiente, o professor. Ao motivarmos os estudantes, apoiamos a geração de um propósito, da curiosidade que motiva a descoberta, ao colocar o estudante em ação frente ao objeto de conhecimento, e, de forma crítica, avançar para a reflexão, a construção de conceitos é mais significativa e possibilita o desenvolvimento de habilidades.

Esse modelo, contrapõe-se à “educação bancária”, ação em que o educador, único detentor do conhecimento, deposita nos estudantes informações que serão memorizadas e repetidas em provas ou avaliações. Paulo Freire, de forma crítica a esse modelo de educação, defende que a educação deve promover cidadãos críticos, atuantes, criativos. Para isso, não é a mera recepção de conhecimentos que irá promover o desenvolvimento de habilidades, mas a ação, a problematização que se promove em sala de aula e, assim, professores e estudantes aprendem nesse processo.

Desta maneira, o educador já não é o que apenas educa, mas o que, enquanto educa, é educado, em diálogo com o educando que, ao ser educado, também educa.

FREIRE, Paulo. Educação “bancária” e educação libertadora. Introdução à psicologia escolar, v. 3, p. 61-78, 1997.

O processo de aprendizagem da leitura, por sua vez, sempre vem recheado de incertezas quando analisado sobre a perspectiva de um sujeito que aprende na e pela ação. Paulo Freire apresenta, em sua Carta aos professores, um trecho que possibilita essa reflexão.

Ler é uma operação inteligente, difícil, exigente, mas gratificante. Ninguém lê ou estuda autenticamente se não assume, diante do texto ou do objeto da curiosidade a forma crítica de ser ou de estar sendo sujeito da curiosidade, sujeito da leitura, sujeito do processo de conhecer em que se acha. Ler é procurar buscar criar a compreensão do lido; daí, entre outros pontos fundamentais, a importância do ensino correto da leitura e da escrita. É que ensinar a ler é engajar-se numa experiência criativa em torno da compreensão. Da compreensão e da comunicação.

FREIRE, PAULO. CARTA DE PAULO FREIRE AOS PROFESSORES. ESTUDOS AVANÇADOS, V. 15, P. 259-268, 2001.

Quando o autor apresenta a relação entre o “ensino correto da leitura e da escrita” observamos, entre outros aspectos, a importância fundamental do estudante como sujeito do processo, ou seja, ao tornar-se protagonista das ações realizadas, verificamos o papel da ação nas metodologias ativas. Cada vez mais, nessas breves reflexões, verificamos a importância da filosofia freiriana para uma educação mais ativa e inovadora. Vamos dar continuidade a essa reflexão em próximos textos!

Oficinas levam abordagem STEAM à rede municipal de Piracicaba

Atividades com alunos e professores mostram a importância dos desafios práticos para o protagonismo estudantil

Um projeto piloto da ArcelorMittal em parceria com a Tríade Educacional está levando uma formação em STEAM para quase 600 professores da rede municipal de educação de Piracicaba, município a 160 km de São Paulo. STEAM, um acrônimo em inglês para Ciências, Tecnologia, Engenharia, Artes e Matemática, é uma abordagem educacional que propõe uma forma de interagir com os conhecimentos de forma prática, mão na massa, e interdisciplinar, conectado com o contexto dos estudantes. 

A formação dos docentes está em curso desde março. Em agosto, os diretores da Tríade foram pessoalmente a Piracicaba, onde visitaram diversas escolas e lideraram oficinas. “Realizamos duas oficinas com estudantes, em escolas diferentes, para turmas do segundo e do quinto ano do ensino fundamental. O objetivo foi trazer uma vivência sobre a proposta de desafios STEAM”, conta Leandro Holanda, cofundador e diretor da Tríade. 

Partindo de questões e problemas próximos dos estudantes, um desafio tem o potencial de fazer com que as crianças e jovens mobilizem conhecimentos de várias áreas para elaborar uma resposta criativa e coletiva. “As oficinas promovem a ideia de se olhar na escola para a engenharia, para a resolução de problemas. Em uma das oficinas, os alunos desenvolveram armadilhas para o mosquito da dengue”, cita Holanda. As oficinas aconteceram nas escolas municipais Prof.ª Elisabeth Consolmagno Cruz e Padre Pedro Baron.

As oficinas usaram alguns elementos simples de eletrônica, como luzes de led, pequenos motores e circuitos, junto com material de papelaria simples e sucata. Os estudantes precisaram acionar vários conhecimentos na resolução do problema, ao mesmo tempo em que puderam se divertir com suas construções.
 

Estudantes da EM Padre Pedro Baron criam protótipos de armadilha para mosquito da dengue.

Além das atividades voltadas diretamente aos alunos, Leandro Holanda e Lilian Bacich, também cofundadora da Tríade, organizaram oficinas com professores, acompanharam algumas reuniões de HTPC (horário de trabalho pedagógico coletivo) e fizeram uma reunião com os gestores das escolas da rede municipal. 

Os encontros nas HTPC aconteceram nas escolas municipais Maria Benedicta Pereira Penezzi, Joaquim Carlos Alexandrino de Souza, Profª Antonia Benedita Eugênio e Prof.ª Elisabeth Consolmagno Cruz e buscaram apoiar os docentes na elaboração de seus projetos.

Foi muito bom poder interagir com um grupo de educadores, nas escolas visitadas, que identificam o potencial do STEAM para atingir os objetivos de aprendizagem que fazem parte do currículo da rede, não tornando a proposta como uma ‘tarefa’ a mais, mas como uma forma de tornar mais significativa a aprendizagem, comenta Bacich.

Equipe docente, coordenadora e diretora da E.M. Prof.ª Elisabeth Consolmagno Cruz participam de HTPC com Lilian Bacich

O encontro com todos os coordenadores da rede teve objetivo de enfatizar o papel de protagonismo que os estudantes precisam ter. Por meio de uma atividade mão na massa, mostramos o que é um protótipo num projeto STEAM e como ele pode estimular a criatividade e a colaboração entre os estudantes. Nosso olhar é que os produtos finais tenham muito a mão dos estudantes, que eles realmente possam propor e desenvolver suas ideias, afirma Holanda.

A professora Herika Lucia Machado, coordenadora na rede de Piracicaba, acredita que os encontros levaram a novos aprendizados. “Nós temos a tendência de já pensar no produto final, então fazemos alguma proposta para chegar nisso. Mas precisamos entender que existe um processo – e que esse produto final pode ser diferente. Foi uma experiência maravilhosa e os professores adoraram”, disse. 

Nos dias 20 e 21 de outubro, a rede de Piracicaba vai ter sua Jornada Pedagógica, em que os professores terão a oportunidade de compartilhar os projetos STEAM que estão realizando. 

 

Grande alcance 

Embora nem todos os docentes estejam participando das formações, Herika explica que os aprendizados acabam sendo propagados para toda a rede. Diz ainda que muitos docentes conseguem incorporar algumas das “lições” ainda que prefiram não aderir completamente à proposta STEAM. 

Os professores perceberam, mesmo aqueles que se sentem mais à vontade em aulas tradicionais expositivas, que não é uma coisa tão extraordinária, tão fora da casinha. Podemos trazer o pensamento STEAM para trabalhar alguns conteúdos e colocar a criança como protagonista. Os encontros serviram para cada um enxergar que transformar suas aulas é possível!, afirma Herika.

A iniciativa de formação docente em Piracicaba faz parte de um projeto maior, a Liga STEAM, um movimento de alcance nacional que vai envolver 10 mil professores e 250 mil estudantes até o final deste ano. O objetivo da liga é formar e conectar uma rede de educadores que sejam referência em STEAM em nosso país!  

Repostagem de matéria publicada em https://ligasteam.com.br/blog/oficinas-levam-abordagem-steam-a-rede-municipal-de-piracicaba

Planejamento e Neurociência, qual a relação?

Imagem de Ermal Tahiri por Pixabay

Recentemente, ao organizar meus estudos sobre Planejamento para compreensão (WIGGINS e McTIGHE, 2019) na elaboração de uma formação para uma rede de ensino, deparei-me com um livro do McTighe explorando, com Judy Willis, a relação entre o planejamento (UbD) e a Neurociência. São muitas as reflexões possíveis, mas alguns trechos me chamaram a atenção e compartilho por aqui para que possamos refletir juntos e, se alguém da Neurociência que ler este texto puder trazer ainda mais reflexões, será incrível!

1. Estudantes precisam de oportunidades para o desenvolvimento de funções executivas

A partir de oportunidades regulares, em sala de aula, de identificar objetivos, pessoais e coletivos, ao longo do trabalho com uma determinada unidade de estudo; aprender e aplicar estratégias para colocar em ação aquilo que é estudado em sala de aula; acompanhar seu progresso ao longo do percurso por uma unidade de estudo, verificando onde precisa aprofundar-se mais e onde já pode avançar para novos tópicos, os estudantes começam a se tornar capazes de aplicar em diferentes situações aquilo que aprendem em sala de aula, não apenas na escola, mas em situações do cotidiano. Gradativamente, vamos avançando do apoio à memória de curto prazo (ao memorizar todo um conteúdo para devolver em uma avaliação pontual) para uma memória de longo prazo que, realmente, significa a internalização das aprendizagens possibilitadas por um planejamento de experiências de aprendizagem cuidadosamente desenhadas, como o que é proposto nas pesquisas de Planejamento para a compreensão.

Mesmo que o córtex pré-frontal do cérebro desenvolva durante os anos escolares as funções executivas de direcionamento objetivo no ato de priorizar, planejamento sistemático, automonitoramento, adiamento de gratificação, estas não aparecem automaticamente. Estudantes precisam de um fluxo de oportunidades para desenvolver essas habilidades e as conexões neurais que as sustentam (em tradução livre).

MCTIGHE E WILLIS, 2019

2. Planejar de forma reversa favorece o desenvolvimento integral dos estudantes

Em texto recente, comentei sobre engajamento dos estudantes e, quando observamos todos os elementos que fazem parte do Estágio 1 do Planejamento para a compreensão, identificamos as necessidades de ampliar o nosso olhar ao planejar experiências de aprendizagem. No Estágio 1, os autores falam de metas que geram a transferência; apresentam o desenho de big ideas, que são uma lente conceitual, no sentido de que apontam para ideias presentes no centro de compreensão de um assunto e que, de forma transversal, são retomadas e ampliadas durante a vida escolar dos estudantes; discutem sobre questões essenciais, que são suficientemente provocativas ao promoverem a investigação, a pesquisa, a reflexão e, por fim, comentam sobre conceitos e procedimentos que precisam estar presentes em um planejamento. A partir desse ponto de partida, tendo objetivos educacionais que envolvem conceitos, procedimentos, atitudes, temos condições de pensar em critérios e evidências a serem obtidos no processo e, só então, planejar a experiência de aprendizagem. Esses pontos conectam-se com o desenvolvimento das funções executivas cerebrais “porque elas são um meio e um fim para um aprendizado duradouro” (McTIGHE e WILLIS, 2019).

Quando se planeja para trás (backward design) a partir de metas de transferência de longo prazo enquanto desenvolve simultaneamente os conjuntos de habilidades necessárias para a consecução das metas, (1) estudantes vão desenvolver e aprofundar os conhecimentos conceituais necessários para transferir seus aprendizados, (2) as conexões neurais do cérebro dos estudantes associadas com o conjunto de habilidades das funções executivas será fortalecido, resultando na habilidade de longo prazo de ser um aprendiz autodirecionado e com foco nos objetivos (em tradução livre).

MCTIGHE E WILLIS, 2019

Há muitas outras reflexões que podem ser promovidas quando buscamos associar o planejamento para a compreensão com o desenvolvimento cognitivo dos estudantes e, nesse sentido, os autores reforçam algo que já exaustivamente discutimos por aqui: mais do que ter acesso aos conhecimentos que podemos acessar a um simples toque em um celular ou computador, precisamos desenvolver possibilidade dos conhecimentos serem aplicados em ações que gerem reflexão e que possibilitem sua utilização em novas situações, para que possamos falar em desenvolvimento integral. Planejar com um foco no que pretendemos desenvolver nos estudantes vai além da entrega de planos de ensino que ficam engavetados como uma ação meramente burocrática.

Sugiro a leitura do site a seguir, além dos materiais indicados no texto.

Vamos conversar sobre STEAM?

Ciência, tecnologia, engenharia, artes e matemática, em inglês, compõem as iniciais da palavra STEAM. O termo tem sido utilizado com as iniciais em inglês por ser um movimento mundial e, cada vez mais, tem sido recorrente nos discursos educacionais e, por esse motivo, talvez, vemos surgir estratégias que prometem revolucionar a educação por meio dessa abordagem. Começo esse texto defendendo que não há uma bala de prata na educação: não é por meio do STEAM, das metodologias ativas, dos projetos que iremos solucionar todos os desafios na educação. Mas, com muito equilíbrio, pode ser mais uma das peças desse enorme quebra-cabeça que precisamos montar para desenvolver habilidades tão importantes para os cidadãos do século XXI.

“É importante estabelecer que não existe uma única metodologia ou estratégia que seja capaz de transformar a educação. Esse processo é lento e requer planejamento minucioso, seja o planejamento das atividades que serão realizadas para proporcionar essas experiências de aprendizagem, seja um planejamento institucional estratégico que envolva um redesenho de espaços, de infraestrutura, da formação docente.”

BACICH e HOLANDA, 2020

Para trazer as questões fundamentais do STEAM que temos defendido, pois há muitas e variadas definições para a abordagem, levanto 3 pontos pra começo de conversa:

1. STEAM como abordagem e não como metodologia

Se o acrônimo trata da reunião de áreas (ciências, tecnologia, engenharia, artes e matemática), não há como encontrarmos um passo a passo para a execução de propostas que consideram o STEAM em sua essência. Assim, não há um método para o STEAM, mas há elementos fundamentais que podem apoiar a escolha de um método adequado para a implementação da abordagem. Podemos considerar que a resolução de problemas e a inclusão das diferentes áreas na sua resolução, em um formato transdisciplinar, é uma das maneiras de considerarmos o STEAM na educação.

2. Robótica, pensamento computacional, maker podem fazer parte do STEAM, mas apenas o uso desses recursos não torna um projeto STEAM

O uso de uma estratégia de robótica, considerando a programação, o maker, etc., pra construir uma engenhoca sem que ela se relacione com um problema a ser resolvido (que é a essência da “engenharia”), apenas favorece o exercício de procedimentos importantes e interessantes, mas não trabalha com a essência do movimento STEAM education. Corremos o risco, como já vimos em outras situações, de nomear toda e qualquer experiência que utiliza a tecnologia digital como uma experiência STEAM.

3. A ciência e a tecnologia são fios condutores da abordagem STEAM, e sua implementação depende de um planejamento de longo prazo

Para não tornamos o STEAM mais uma palavra da moda, é importante ter clareza de que inseri-lo na construção de experiências de aprendizagem significa dar sentido às práticas realizadas. Ações pontuais, que não se incluem de forma orgânica à realidade de sala de aula, tendem a desaparecer do mesmo jeito que chegam… para considerar a ciência e a tecnologia nas rotinas escolares, fundamental que existam conexões entre aquilo que os educadores consideram suas necessidades e, mais ainda, que oferecem condições de promover o desenvolvimento integral dos estudantes.

Além desses pontos, há muitos outros e espero tornar esse post um início de conversa. Para isso, convido você a participar, nos comentários, com dúvidas ou reflexões sobre a abordagem. Vamos construir juntos?

Referência:

BACICH, Lilian; HOLANDA, Leandro. STEAM em sala de aula: a aprendizagem baseada em projeto integrando conhecimentos na educação básica. Porto Alegre: Penso, 2020.

Podcasts sobre os capítulos do livro> Spotify

Educação Híbrida:

Reflexões essenciais para uma educação híbrida (BACICH, MORAN, FLORENTINO, 2021)

[…]

Neste texto, defendemos a ideia de uma Educação Híbrida, que considere as definições do Ensino
Híbrido, enfatize a participação de todos os atores envolvidos e o redesenho das combinações possíveis de espaços, tempos e metodologias para oferecer melhores experiências de aprendizagem, e contemplar as diferentes realidades do nosso país, considerando propostas com e sem o uso de tecnologias digitais. […]

Para uma reflexão sobre uma educação híbrida, identificamos alguns pontos essenciais. 

  1. O primeiro se refere aos aspectos fundamentais para que a educação híbrida atinja todo o seu potencial, colocando o estudante e as relações que ele estabelece com o conhecimento no centro do processo.
  2. O segundo ponto está relacionado aos modelos de implementação que podem ser organizados em diferentes cenários.
  3. O terceiro ponto diz respeito à formação dos educadores para que a educação híbrida possa ser organizada de forma equilibrada, coerente e abrangente.

O estudante no centro do processo

Para que o estudante esteja no centro do processo, é necessário considerar diferentes aspectos que possibilitem o desenvolvimento da autonomia e do protagonismo. Para isso, as experiências de aprendizagem devem ressignificar o papel dos estudantes e do professor; incluir diferentes espaços (digitais ou físicos, na escola);  considerar uma avaliação formativa e que repercuta em novas trilhas de aprendizagem ou redirecionamento de trilhas já existentes; contar com uma gestão que ampare escolhas e esteja aberta aos erros construtivos inerentes a processos inéditos e inovadores; entender os recursos digitais como potencializadores das ações de investigação, troca entre pares e construção de conhecimentos capazes de repercutir nas concepções de toda a comunidade escolar e, consequentemente; contribuir para a adoção de uma mentalidade de crescimento que impacte na transformação de uma cultura escolar centrada no professor para uma visão de construção coletiva e redesenho de papéis (BACICH et al, 2015).

Modelos de implementação

Os modelos utilizados nas publicações sobre ensino híbrido se combinam, se integram e ganham relevância com o foco na aprendizagem ativa dos estudantes, que é uma premissa para a educação híbrida. As metodologias ativas envolvem um percurso metodológico que possibilita a ação do estudante envolvendo-o na aprendizagem por descoberta, por investigação, por resolução de problemas e por projetos. Elas procuram criar situações de aprendizagem nas quais os aprendizes possam produzir, pensar e conceituar o que fazem, construir conhecimentos sobre os conteúdos envolvidos nas atividades, bem como desenvolver a capacidade crítica, refletir sobre as práticas que realizam, oferecer e receber feedback, aprender a interagir com colegas e professores e explorar atitudes e valores pessoais. Assim, não há modelos únicos ou propostas que não podem ser combinadas, desde que se tenha como ponto de partida uma estrutura em que o estudante esteja no centro do processo, ele que desenvolve competências e habilidades.

Formação docente

Aspectos centrais da formação docente precisam ser considerados. Entre eles, podemos destacar o desenvolvimento das competências digitais dos docentes, alinhadas ao conhecimento do conteúdo e ao conhecimento pedagógico do conteúdo. O objetivo é que a inserção das tecnologias digitais, ou outros recursos, amplie as possibilidades dos estudantes interagirem com as habilidades e competências que se pretende desenvolver – preferencialmente com, mas também sem o uso de recursos digitais.

A Educação Híbrida, ao incluir a personalização e o redesenho das experiências de aprendizagem, apresenta-se como uma possibilidade de impulsionar a escola para o que se espera do século XXI, fazendo com que a comunicação, a criatividade, o pensamento crítico, a colaboração e a resolução de problemas tenham um papel ainda maior que uma lista de conteúdos distribuídos em um planejamento anual.

(BACICH, Lilian; MORAN, José; FLORENTINO, Elisangela. Educação híbrida: reflexões para a educação pós-pandemia. POLÍTICAS EDUCACIONAIS EM AÇÃO. Número 14 – abril de 2021. Leia o documento na íntegra aqui.

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Engajamento dos estudantes: algumas reflexões

Podemos considerar que esta estudante demonstra engajamento? O que determina o engajamento de um estudante? De qual engajamento estamos falando?

O engajamento dos estudantes, em aulas online, no período remoto; em aulas presenciais, no retorno às escolas; nos modelos mistos, quando parte dos alunos está na instituição de ensino e parte em casa; entre outras configurações tem sido um questionamento frequente de educadores que lecionam desde a educação infantil até o ensino superior. Várias podem ser as respostas possíveis sobre como melhorar este engajamento. Porém, antes de mais nada, seria interessante uma reflexão: de que engajamento estamos falando? Do engajamento intelectual/cognitivo com os objetos de conhecimento? Do engajamento acadêmico com o que se espera do papel do estudante em sala de aula? Do engajamento socioemocional com a experiência de aprendizagem, com os colegas, com o docente?

Outro ponto relevante a ser analisado é se a afirmação sobre maior ou menor engajamento da turma está sendo generalizada pela falta ou excesso de engajamento de alguns estudantes. É muito comum ouvirmos relatos de professores que comentam: “os estudantes quase não participaram da aula hoje…”. Algumas vezes, nem todos falaram, perguntaram, interagiram. Outras vezes, apenas alguns participaram todo o tempo. A primeira reflexão é que esses questionamentos não são decorrentes da pandemia, mas sempre existiram nas salas de aula. Em seguida, vamos refletir sobre três pontos: selecionar como coletar informações sobre os tipos de engajamento, identificar ações que podem ser realizadas para engajar, verificar o impacto e rever as estratégias escolhidas.

  1. Coleta de informações

Ao diferenciar os tipos de engajamento, coletar evidências sobre o engajamento acadêmico verificando como os estudantes interagem com as propostas em sala de aula, sabendo que essas informações trarão dados diferentes de acordo com a faixa etária. Os estudantes dos anos iniciais, por exemplo, que no final de 2019 estavam na educação infantil e, hoje, estão no final do 2o ano, podem apresentar dificuldade na compreensão da rotina da aula, na organização dos materiais, até mesmo no uso de livros didáticos ou cadernos. Os do ensino médio, que estavam gerenciando o tempo de uma forma mais “fluida” no período remoto, podem mostrar-se mais impacientes com as rotinas de aulas com menos tempo de descanso entre elas. Em relação ao engajamento cognitivo, é importante ter clareza sobre as aprendizagens essenciais que precisam ser desenvolvidas, verificando se as propostas estão sendo realizadas com facilidade ou dificuldade pelo grupo de estudantes (e cada um deles) e se a dificuldade tem relação com os aspectos acadêmicos ou com os objetos de aprendizagem e desenvolvimento selecionados. No engajamento socioemocional, várias questões precisam ser analisadas pois as emoções estão “a flor da pele” nesse momento e percebemos, principalmente com os alunos mais velhos, uma maior impaciência e agitação em alguns, e o oposto, em outros. Listar quais são, na sua instituição, as necessidades de engajamento acadêmico, cognitivo e socioemocional que são relevantes e, ao acompanhar os estudantes trabalhando em pequenos grupos, observá-los, registrando suas impressões, além de incluir momentos de conversa com os estudantes de forma individual. Registros são muito importantes para não se confiar apenas na memória, pois, nesse momento, professores têm muitas demandas e ainda se adaptam à nova rotina, com todo o impacto emocional que, enquanto seres humanos em uma pandemia, também enfrentam.

2. Identificação das ações

Com os registros das observações, importante listar ações específicas a serem adotadas em relação a cada um dos elementos listados. Para o engajamento acadêmico, escolha um dos itens que precisa ser melhor apropriado e, se possível, estabeleça pequenas concessões sempre que possível, como um maior tempo de descanso entre as atividades (em relação ao que ocorria antes da pandemia) o que também apoiará emocionalmente os estudantes, orientações procedimentais para o uso dos materiais escolares, etc. Para os aspectos cognitivos, porém, há necessidade de repensar percursos metodológicos. Como já comentado por aqui, em outros textos, a mesma aula para todos os estudantes não oferecerá oportunidades iguais para todos… Nesse sentido, construir experiências de aprendizagem que considerem as necessidades dos estudantes é fundamental.

3. Verificação e revisão

Verificar o impacto das ações planejadas e revisar o proposto é essencial nesse processo. Assim, manter uma postura de pesquisador, principalmente no momento atual, quando identificamos uma dificuldade de engajamento emocional dos estudantes no retorno às instituições de ensino e a necessidade de promovermos avanços cognitivos e acadêmicos. Nesta postura de pesquisador, coletar informações sobre cada um dos estudantes torna-se necessário, para evitarmos generalizações.

Para saber mais sobre os tipos de engajamento:

RUTHERFORD, Camille (2021). FOCUSING ON STUDENT ENGAGEMENT.  In: HAN, Huili; WILLIAMS, James H.; CUI, Shasha. Tackling Online Education: Implications of Responses to COVID-19 in Higher Education Globally, p. 47 – 61.